O
ford vermelho tingira-se de preto: era noite e Leónidas sempre tivera impulso
próprio para se camuflar na mesma; era dele. Na noite tudo poderia acontecer e
a cacofonia não mais se fizera ouvir sentir: era silêncio que escutava e
até o seu respirar pesado carreava sofregamente, a doer: nos ombros.
Amante
da noite, nela tinha nascido: peludo, de olhos abertos; demorou três dias para
o primeiro choro, quase o julgavam morto. Era vivo, provou-se agarrado à vida
mais que ninguém – e, por essa razão, recusava-se a chorar: o choro cheirava a
podre, sangue e suor – e não é vida tão mais que isso?
Recusava-se
ser clone: que mania os desta raça nos obrigarem a tornarmo-nos umas merdas de
umas marionetas! Puxa a corda daqui, estica dali, faz um sorriso plástico: finge-te.
Finge-te sensível, amigo dos animais, caridoso com os pobres, importado pelos
demais. Finge-te. Puxa a corda, acena o braço direito, estica as rugas.
Leónidas tinha mais para ser do que um boneco postiço! Pesa-lhe tal
possibilidade: nos ombros.
A
vontade da carne; os pensamentos para si só (como se os pudesse ou conseguisse
partilhar!); o seu cigarro sensitivo; o cheiro do pescoço de uma mulher, a
simbiose dos pelos das costas dela flectidos perante si: é isto, precisamente
isto, nada menos que isto – a vida.
Ninguém
ensina Leónidas a viver: da noite que se fez dia, sem hipocrisias nem falsos
moralismos… Leónidas é tudo quanto queremos (e não podemos) ser.
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